uma perspectiva evolucionista sobre os meios de conversação da internet
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2. Taxonomia

Quais são os meios de conversação da internet?

Para enumerar os meios de conversação da internet, caracterizá-los e diferenciá-los, elaboramos a taxonomia apresentada neste capítulo. Taxonomia é a ciência da classificação. Ao estabelecermos uma taxonomia, reconhecemos melhor os diferentes meios de conversação e identificamos as características de cada um em comparação com os demais. Também nos habilitamos a reconhecer e classificar os meios de conversação implementados em serviços de conversação nos diferentes sistemas computacionais. Com a taxonomia pretendemos discutir o potencial e as restrições de conversação em cada meio, bem como alertar sobre algumas confusões conceituais e abusos terminológicos. Sem uma boa taxonomia, correríamos o risco de realizar análises inadequadas e estabelecer comparações entre coisas não relacionadas.

Taxonomias são empregadas em diversas áreas. Na Biologia, a taxonomia é fundamental para a identificação, descrição, nomenclatura e classificação dos seres vivos. Para um biólogo, a taxonomia dos seres vivos apoia a identificação das características que diferenciam, por exemplo, o ser humano de um chipanzé.

Taxonomia dos seres vivos

A classificação dos seres vivos tem como base a Taxonomia de Linnaeus (1735). As unidades de classificação em uma Taxonomia são os táxons, que correspondem a grupos de organismos com características em comum. Cada táxon possui um nome e corresponde a um nível hierárquico na Taxonomia de Linnaeus, composta de sete níveis principais: Reino, Filo, Classe, Ordem, Família, Gênero e Espécie. Os seres vivos são classificados segundo critérios como aspectos morfológicos, evolutivos, funcionais e comportamentais. A representação gráfica da Taxonomia dos Seres Vivos é a Árvore da Vida ou árvore filogenética, um diagrama em forma de árvore no qual cada nó representa um antepassado comum entre os descendentes.

Para elaborarmos uma taxonomia para os meios de conversação, primeiro precisamos reconhecer quais são os meios culturalmente estabelecidos para depois buscarmos na literatura os critérios de classificação que os caracterizam e diferenciam. Neste capítulo: esclarecemos o que deve ser classificado no âmbito da conversação mediada pela computação; elaboramos um modelo para a identificação dos meios; discutimos os critérios adotados para diferenciar e caracterizar os meios; discutimos como identificar o meio que está implementado num dado serviço de conversação como os do Facebook; e discutimos algumas confusões na identificação de meios semelhantes.

Sistema, serviço, meio ou gênero textual?

Se lhe perguntarmos quais são os sistemas de email que você conhece, talvez você cite o Gmail e o Hotmail. De fato, o Gmail implementa um serviço de email, mas também disponibiliza um serviço de mensageiro instantâneo (Google Talk), e por isso não seria totalmente correto reduzir o Gmail a um sistema de email apenas. E o Facebook, seria classificado como o quê? Um sistema de microblog?

O Facebook é classificado como um sistema de rede social, e neste sistema estão implementados vários serviços de conversação – não só um microblog, mas também um mensageiro instantâneo, um serviço de email e até um fórum de discussão.

Um meio de conversação é um modo específico de trocar mensagens. Por exemplo, se perguntamos como é a conversação num mensageiro instantâneo, você explicará que o usuário precisa ter uma lista de amigos cadastrados que também usam o mesmo sistema, e o usuário pode estabelecer uma conversa particular em tempo real (síncrona) com qualquer amigo que estiver online. Atente que essa descrição independe do sistema – esse modo de conversar, que se estabelece por meio do mensageiro instantâneo, está implementado tanto no Facebook quanto no Google Talk, MSN, ICQ, dentre outros sistemas. Portanto, um meio de conversação é uma abstração. Para a realização da conversa, é preciso que o meio esteja implementado em algum sistema computacional – a implementação do meio num sistema é o que aqui denominamos de serviço de conversação.

Um sistema computacional disponibiliza serviços que implementam meios de conversação. Por exemplo, no Facebook: publicamos uma mensagem que será seguida por nossos amigos no serviço “Feed de Notícias”, que se caracteriza em um microblog; pelo “Bate-papo” estabelecemos conversas particulares com os amigos por meio de mensagens instantâneas; pelo serviço “Mensagens” enviamos mensagens de email sendo até possível anexar arquivos; e também conversamos num “Grupo” por meio de um fórum de discussão. Cada um desses modos de conversar corresponde a um meio de conversação. Outro exemplo: o sistema Skype disponibiliza um conjunto de serviços de conversação que implementam diferentes meios para possibilitar uma conversa síncrona, dentre os quais reconhecemos mensageiro instantâneo, áudio e videochamada, áudio e videoconferência. Mesmo o Gmail, que em suas primeiras versões disponibilizava exclusivamente um serviço de email, hoje contém a implementação de outros meios de conversação, como o mensageiro instantâneo (Google Talk), audiochamada, videochamada, audioconferência e videoconferência (Hangouts).

No século passado, o usual era um sistema implementar um único meio de conversação, daí era comum classificarmos os sistemas como um “sistema de email” ou “sistema de videoconferência”. Com o desenvolvimento da web, principalmente com a web 2.0, o comum passou a ser um sistema implementar diversos meios de conversação, como exemplificam os sistemas de redes sociais. Consequentemente, tornou-se inviável classificar os sistemas computacionais em função dos meios de conversação que implementam. Reconhecemos que os serviços de conversação são as unidades que classificamos em função dos meios de conversação.

Neste livro, faremos um abuso terminológico ao empregar o termo “sistema de conversação” para indicar qualquer sistema que disponibiliza serviços de conversação – nesse sentido, o Facebook, que é um sistema de rede social, também é um sistema de conversação. Também consideramos um abuso terminológico dizer “sistema de email”, pois reconhecemos que atualmente um sistema disponibiliza múltiplos serviços de conversação – nesse sentido, preferimos empregar o termo serviço de email.

Mais do que um abuso terminológico, consideramos inadequado dizer que bate-papo, blog ou videoconferência são gêneros textuais. O alerta é para que não ocorra um erro conceitual.

Gênero textual

A definição de gênero é centrada na finalidade do discurso, e não apenas na forma nem no conteúdo do texto (Miller, 1984). Os gêneros se referem aos diferentes tipos de textos encontrados em situações comunicativas recorrentes, estão relacionados com a cultura e são determinados historicamente e socialmente (Marcuschi, 2008 e 2010).

Reconhecemos que serviços de um mesmo meio de conversação possibilitam a realização de textos em diferentes gêneros – por exemplo, um serviço de bate-papo é usado para realizar o sexo virtual, uma entrevista ou um debate educacional. Textos de um determinado gênero podem ser produzidos em serviços que implementam meios diferentes, por exemplo, uma entrevista pode ser realizada através de um serviço de bate-papo ou de email. Por essas razões, consideramos o bate-papo como um meio, e não como um gênero nem como um sistema. Reforçamos que o gênero também não é o objeto de nossa classificação.

Modelo dos meios de conversação da internet

Para começarmos a responder a pergunta proposta no início deste capítulo – quais são os meios de conversação da internet? – precisamos considerar que o reconhecimento dos meios depende da cultura, sendo determinados social e historicamente. Considerando a importância histórica e o reconhecimento social até o momento da publicação deste livro, identificamos os seguintes meios de conversação: email, lista de discussão, fórum de discussão, blog, microblog, mensageiro instantâneo, SMS, bate-papo, mensagens em grupo, videochamada, videoconferência, audiochamada e audioconferência. Representamos esses meios no modelo apresentado na figura a seguir. Um modelo é uma descrição lógica ou matemática representada de forma abstrata, conceitual ou gráfica. Elaboramos esse modelo para apoiar a identificação, análise e classificação dos meios de conversação da internet.

Cada meio se caracteriza num modo de conversar diferente dos demais. No dicionário a seguir explicitamos o modo de conversar que caracteriza cada meio enumerado no modelo, sendo listados exemplos de sistemas populares que disponibilizam algum serviço que implementa aquele meio de conversação. As caracterizações de cada meio estão baseadas nos critérios discutidos na próxima seção.

 

Dicionário dos meios de conversação da internet

Audiochamada Audiochamada (conversa telefônica)
Meio de conversação síncrona entre dois interlocutores com transmissão de áudio.
Exemplos: Skype, Viber
Audioconferência Audioconferência
Meio de conversação síncrona em grupo pequeno com transmissão de áudio.
Exemplos: UberConference, FreeConferenceCall
Bate-papo Bate-papo (chat)
Meio de conversação síncrona para a discussão em turma (ou grupo pequeno) em que todos trocam mensagens textuais curtas.
Exemplos: mIRC, Bate-papo UOL
Blog
Meio de conversação assíncrona em que um autor divulga mensagens de texto elaboradas para serem comentadas por todos.
Exemplos: WordPress, Blogger
Email (correio eletrônico)
Meio de conversação assíncrona entre dois (ou poucos) interlocutores que trocam mensagens de texto elaboradas.
Exemplos: Gmail, Hotmail
Fórum de Discussão
Meio de conversação assíncrona para a discussão entre muitos interlocutores que trocam mensagens de texto elaboradas, organizadas em tópicos.
Exemplos: phpBB, vBulletin
Lista de Discussão
Meio de conversação assíncrona para a discussão entre muitos interlocutores que enviam mensagens de texto elaboradas, organizadas em lista.
Exemplos: Google Groups, Yahoo Groups
Mensageiro Instantâneo (mensagens instantâneas)
Meio de conversação síncrona em que dois interlocutores trocam mensagens de texto curtas.
Exemplos: ICQ, MSN Messenger
Mensagens em Grupo
Meio de conversação assíncrona para a discussão em grupos pequenos (ou turmas) em que todos trocam mensagens de texto curtas.
Exemplos: WhatsApp, Conversa em Grupo no Facebook
Microblog
Meio de conversação assíncrona em que o autor divulga mensagens de texto curtas para serem comentadas por todos.
Exemplos: Twitter, Tumblr
SMS (torpedo)
Meio de conversação assíncrona entre dois interlocutores que trocam mensagens de texto curtas.
Exemplos: WhatsApp, Handcent
Videochamada
Meio de conversação síncrona entre dois interlocutores com transmissão de áudio e vídeo.
Exemplos: Skype, FaceTime
Videoconferência
Meio de conversação síncrona em grupo pequeno com a transmissão de áudio e vídeo.
Exemplos: Skype, Hangouts

 

Conseguimos identificar 13 diferentes meios de conversação. Por um lado, é surpreendente que haja tantos modos diferentes de se conversar por esse único suporte, as redes de computadores; ainda mais se considerarmos que antes da computação conhecíamos poucos meios de se conversar além da conversação face-a-face: carta, telégrafo, telefone, rádio amador, e teleconferência por tv (desconsiderando os meios unidirecionais de comunicação que não se caracterizam como meios de conversação). Por outro lado, também é surpreendente constatarmos que é possível abstrair em apenas 13 modos diferentes de se estabelecer uma conversa pela internet dada a grande diversidade de serviços de conversação implementados nos incontáveis sistemas computacionais.

Os meios evoluem, por isso a lista aqui apresentada precisa ser revista e atualizada de tempos em tempos. É possível que algum sistema já tenha inovado ao ponto de implementar um serviço de conversação que se caracterize como um novo meio; contudo, é preciso haver uma prática social para que o novo modo de se comunicar se consolide como um meio relevante ao ponto de ser incluído no modelo aqui proposto. Precisa ser reconhecido pelos usuários, desenvolvedores de sistemas, pesquisadores ou pela mídia especializada. De preferência, esse novo meio deve encontrar-se implementado em alguns sistemas populares, o que caracteriza sua relevância.

Critérios de classificação

A elaboração de uma taxonomia consiste em agrupar elementos com atributos em comum, arranjá-los em grupos e rotulá-los, produzindo uma classificação. A classificação, que possibilita identificar e diferenciar os elementos, se realiza por meio de critérios geralmente estabelecidos por especialistas da área. Selecionamos da literatura os critérios de classificação que consideramos os mais adequados para caracterizar e diferenciar os meios de conversação enumerados no modelo que elaboramos. A seleção dos critérios deve ser suficiente para diferenciar unicamente cada meio de conversação.

Atente que as diferenças entre os meios de conversação não estão relacionadas com as interfaces dos sistemas nem com a infraestrutura de conexão – as diferenças estão no modo de conversar, isto é, nas possibilidades e restrições impostas para a realização da conversa em cada meio. Neste sentido, identificamos que os critérios estão relacionados com as possibilidades de interação entre os interlocutores e com as características das mensagens trocadas nesses meios.

Sobre a interação entre os interlocutores, ressaltamos que neste livro estudamos a conversação, em que os interlocutores são ao mesmo tempo emissores e receptores de mensagens. Os critérios que consideramos relevantes quanto às variações nas características da interação entre os interlocutores são: sincronia da conversação, relação entre os interlocutores, privacidade da conversação e quantidade de interlocutores.

As características de cada meio, suas possibilidades e restrições, dão forma ao discurso. Com relação às variações nas características das mensagens, em termos de formato e não de conteúdo, reconhecemos os seguintes critérios para a diferenciação dos meios: forma de linguagem, organização das mensagens e tamanho da mensagem.

Sincronia da conversação

Os meios de conversação são divididos entre os que possibilitam uma conversação síncrona, ao vivo, em tempo real; e aqueles que possibilitam uma conversação assíncrona, em que os interlocutores não precisam estar conectados ao mesmo tempo. Essa diferenciação baseia-se no sistema de classificação espaço-tempo (Ellis et al., 1991), em que adotamos apenas o critério tempo, separando os meios síncronos dos assíncronos. Em relação ao espaço, os meios de conversação são projetados para estabelecer a comunicação remota na qual os interlocutores estão distribuídos em locais diferentes (não estão face-a-face no mesmo lugar); portanto, o critério espaço não foi adotado porque não diferencia os meios de conversação.

Meios síncronos implicam num discurso muito diferente dos meios assíncronos. Quando a conversação é síncrona, a mensagem enviada é recebida praticamente no mesmo instante. O discurso se assemelha ao da conversação face-a-face, sendo comumente usada uma linguagem mais informal, com características da oralidade. Por estarem conectados ao mesmo tempo, os interlocutores esperam uma resposta rápida. A rápida troca de mensagens e a informalidade do discurso reforçam a sensação de presença. Essas características fazem o discurso tender para um tom mais pessoal e carregado de emoção. Já na conversação assíncrona, quando a mensagem é armazenada para ser recuperada posteriormente, os interlocutores não esperam uma resposta imediata e as interações tendem a ocorrer em um intervalo maior de tempo. Com mais tempo, os interlocutores elaboram melhor o conteúdo da mensagem, revisam antes de enviar, consultam outros textos e referências, inserem imagens, vídeos e documentos. A conversação assíncrona promove um discurso mais formal, polido e letrado.

Geralmente escolhemos usar meios síncronos, como a videochamada, quando a conversa pode ser informal, ou quando temos urgência em obter uma resposta, ou quando sabemos que a pessoa também está conectada no mesmo momento e não é um problema interromper as atividades daquela pessoa para conversarmos. Escolhemos meios assíncronos, como o email, quando: não temos a necessidade de estabelecer uma conversação imediata, não temos a certeza de que nossos interlocutores estão disponíveis para uma conversa, precisamos elaborar mais a mensagem ou precisamos receber uma resposta formal.

Implicações da sincronia para a implementação de sistemas

Os sistemas que implementam serviços de conversação síncrona precisam apresentar informações sobre a presença e o estado dos interlocutores no instante da conversa, já os assíncronos precisam lidar com o histórico da conversação e diferenciar as mensagens já lidas das que ainda não foram acessadas (Santos et al., 2011).

Além da dicotomia síncrono e assíncrono, analisando a sincronia da conversação reconhecemos que os meios possuem diferentes expectativas de tempo de resposta, que é o intervalo médio de tempo decorrido entre o envio de uma mensagem e o recebimento de uma resposta. Por exemplo, espera-se que uma mensagem de email seja respondida até o dia seguinte, sendo razoável que a resposta venha em poucas horas, mas não é razoável que a resposta demore mais que uma semana. Já no mensageiro instantâneo, espera-se uma resposta muito mais rápida, podendo vir em poucos segundos, mas não sendo razoável demorar uma hora para se obter uma resposta (ou não se caracterizaria como “mensagem instantânea”). Assim, os meios de conversação são distribuídos num eixo contínuo em função do tempo de resposta, em que os meios síncronos apresentam uma resposta que tende ao imediato, enquanto nos meios assíncronos o tempo esperado de resposta é maior.

Nos meios síncronos, a interação entre os interlocutores é estabelecida num curto intervalo de tempo, em poucos segundos ou minutos. Na áudio e videochamada, e na áudio e videoconferência, o tempo de transmissão de áudio e vídeo deve ser de apenas poucos milissegundos para não comprometer a qualidade da conversação. Já em meios textuais como mensageiro instantâneo e bate-papo, o tempo entre receber uma mensagem e respondê-la pode levar algumas dezenas de segundos ou poucos minutos sem comprometer a conversação – alguns autores até preferem classificar esses meios como quase-síncronos, pois se distanciam mais das características da conversação face-a-face dado que as mensagens são recebidas somente após terem sido completamente formuladas em vez de serem recebidas durante o processo de formulação (exceto os serviços que transmitem o texto caractere a caractere durante a digitação).

De forma parecida com a distribuição que fizemos dos meios num contínuo em função do tempo esperado de resposta, Kock (2004) caracteriza comparativamente os meios de conversação em função da semelhança com a conversação face-a-face, critério que ele denomina de “naturalidade da mídia”. Desde a pré-história o homem usa a comunicação face-a-face como principal meio de comunicação; estamos biologicamente adaptados para nos comunicarmos dessa forma. Quanto maior a diferença entre um meio de conversação e a comunicação face-a-face, mais obstáculos esse meio apresenta para a comunicação por exigir mais esforço cognitivo dos interlocutores, e assim menor é a sua naturalidade. Os meios de conversação mais naturais são os que mais se aproximam da conversação face-a-face, sendo a videochamada e videoconferência os mais naturais por possibilitarem a fala, gestos e olhares. Meios de conversação assíncronos que requerem o uso da linguagem escrita com mensagens elaboradas (como o email ou o blog) são menos naturais do que meios síncronos (como o mensageiro instantâneo), que apresentam respostas mais rápidas, com linguagem mais informal e com características da oralidade mais próximas da conversação face-a-face. Do nosso ponto de vista, a naturalidade da mídia está relacionada com o tempo esperado de resposta que caracteriza a sincronia da conversação: quanto maior o tempo médio de resposta, mais elaborado o discurso, mais letrado e menos natural.

Cabe ressaltar que vem ocorrendo uma diminuição no tempo de resposta em alguns meios assíncronos, em decorrência: da popularização do uso de smartphones (que possibilitam os usuários permanecerem conectados o tempo todo), da grande quantidade de interlocutores conectados, do alerta das mensagens recebidas e da maior capacidade de transmissão em rede. Por exemplo, no Facebook, um usuário tem centenas de amigos-seguidores e, provavelmente, alguns deles estarão online sincronamente prontos para responder imediatamente a mensagem recém-enviada pelo microblog, trazendo características da conversação síncrona para esse meio assíncrono. O mesmo acontece com os meios SMS e Mensagens em Grupo – embora as mensagens até possam ser respondidas rapidamente, são de fato meios de conversação assíncrona, pois as mensagens ficam armazenadas para serem lidas em qualquer momento posterior.

Privacidade da conversação e quantidade de interlocutores

Outro critério relevante para diferenciar os meios de conversação é a privacidade da conversação, que está relacionada com a quantidade de interlocutores que participam da conversa. Alguns meios estabelecem uma conversa particular, restrita a dois interlocutores apenas, enquanto outros meios estabelecem uma conversa entre várias pessoas, variando de um grupo pequeno até multidão.

Numa conversa particular, restrita a duas pessoas, o discurso tende a ser mais pessoal e informal, mais intimista, pois os interlocutores trazem para o discurso referências situacionais vividas por ambos. Numa conversa em grupo, quando enviamos uma mensagem para muitas pessoas, o discurso tende a ser mais impessoal e formal.

Cabe problematizar a noção de conversa particular nos serviços que implementam meios de conversação. É conhecido o problema da fronteira entre o público e o privado nas conversações mediadas pela computação, como as que se realizam pelos sistemas de redes sociais (Recuero, 2012). Por exemplo, ainda que se possa restringir uma postagem ao grupo de amigos no Facebook, basta um amigo compartilhar aquela postagem que os amigos daquele amigo também terão acesso à mensagem. Ou ainda, uma conversa por email iniciada em âmbito particular pode ser encaminhada ou respondida com cópia para outras pessoas. O registro da mensagem confere uma permanência e uma facilidade de transcrição (compartilhar, encaminhar, retuitar) que a privacidade da conversação em rede nunca fica garantida. Contudo, se algum interlocutor torna pública uma mensagem enviada em particular, de forma intencional ou por descuido, está transgredindo a norma de polidez, causando tensões entre os interlocutores. Apesar da não garantia da privacidade, os sistemas são projetados para estabelecer uma conversa percebida como particular ou em grupo – por isso esse critério é relevante para caracterizar os meios de conversação.

Relação entre os interlocutores

Os meios de conversação também restringem como os interlocutores se relacionam numa conversa: um-um, todos-todos e todos-um. A relação entre os interlocutores é bidirecional, diferenciando-se dos meios de comunicação de massa que estabelecem a relação unidirecional um-todos com a comunicação centrada num polo de emissão e sem a possibilidade de retorno da audiência.

Nos meios que estabelecem a conversa particular, como mensageiro instantâneo e SMS, a relação entre os interlocutores é de um para um, isto é, a mensagem é enviada diretamente para uma pessoa, que por sua vez a responde. Em meios de discussão, como lista e fórum, a relação é de todos para todos, pois todos enviam mensagens que são recebidas por todos, e qualquer um pode responder a mensagem recebida. Nos meios blog e microblog é imposta uma assimetria entre os interlocutores da conversação, pois a troca de mensagens é centrada na postagem de um único indivíduo: o autor divulga uma postagem para todos, e todos os seguidores podem responder aquela mensagem específica do autor (relação todos-um). Isso é uma novidade, não só porque ambos os meios foram desenvolvidos mais recentemente, mas principalmente por possibilitarem a conversação em multidões como nenhum outro meio (como mostrado na figura sobre a quantidade de interlocutores), o que de certa forma remete aos meios de comunicação de massa. Contudo, pela possibilidade da postagem ser comentada, estabelecendo a conversa, esses meios são efetivamente de conversação.

Forma de linguagem

Com relação às características da mensagem, o critério mais notável que diferencia os meios é a forma de linguagem: texto, áudio ou vídeo.

A forma de linguagem influencia muito o discurso. Meios baseados em áudio e vídeo, que registram a fala, tornam o discurso mais parecido com o da conversação face-a-face. Já os meios baseados em texto, que realizam a conversação por escrito, apresentam mais formalidade no discurso, principalmente os meios assíncronos.

Do ponto de vista linguístico, considera-se “texto” o discurso que se manifesta tanto pela escrita quanto pela fala (Marcuschi, 1997). Adotamos, contudo, o ponto de vista da informática, em que a fala é registrada em arquivo de áudio e vídeo, e a escrita é registrada em arquivo de texto (codificado em caracteres, como a codificação ASCII). Cabe ressaltar que os serviços que implementam os meios baseados em texto frequentemente possibilitam enriquecer a mensagem com emoticons, imagens, animações, gravação de voz e até videoclipes em anexo – nesse caso a multimídia é um complemento da mensagem escrita e não se constitui a linguagem-base de conversação desses meios.

Organização das mensagens

Os critérios anteriores não são suficientes para diferenciar todos os meios. Por exemplo, o que difere a lista de discussão do fórum é que no primeiro as mensagens são organizadas cronologicamente, listadas em função do tempo, enquanto no segundo as mensagens são organizadas em tópicos e frequentemente são apresentadas hierarquicamente em função do encadeamento estabelecido entre as respostas (threads). A organização das mensagens no log (registro da conversa) influencia muito o discurso.

Nos meios em que a mensagem é transmitida enquanto está sendo produzida, como nos meios baseados em áudio e vídeo, as mensagens são organizadas em fluxo contínuo, o que possibilita a ocorrência de sobreposição de vozes e, para coordenar a conversa, os interlocutores seguem o protocolo social “fala um de cada vez”; poucos interlocutores conseguem participar da conversa ao mesmo tempo (repare na pouca quantidade de interlocutores esperada nesses meios).

Nos meios em que a mensagem é enviada após ter sido formulada, as mensagens são organizadas numa das seguintes topologias: lista (como no email e na lista de discussão), que promove uma discussão sequencial que privilegia a ordem cronológica das mensagens; em tópicos (como no fórum de discussão), em que a conversa é organizada em tópicos e frequentemente é representada a relação de resposta entre as mensagens (threads) que promove aprofundamento e divergência na discussão; ou centrada (como no blog e microblog), que promove uma discussão focada na mensagem inicial e nos interesses do autor da postagem.

Alguns sistemas já empregaram, sem obter muito sucesso, a topologia em grafo (rede entre as mensagens). Esta é uma topologia mais complexa que possibilita o estabelecimento de várias relações entre as mensagens, o que dificulta a compreensão da conversa. Atualmente não se identifica um meio de conversação relevante culturalmente que estruture as mensagens em rede.

Tamanho das mensagens

Ainda é necessário lançarmos mão de um critério de classificação para diferenciar meios como blog e microblog: o tamanho da mensagem. Em todos os meios síncronos, as mensagens tendem a ser curtas em decorrência do pequeno intervalo de tempo de resposta esperado nesses meios. Os meios assíncronos é que se diferenciam mais em função da quantidade esperada de texto por mensagem, sendo que em alguns meios a mensagem tende a ser curta, com pouco texto, enquanto em outros meios a mensagem tende a ser mais elaborada, com mais texto.

Mensagens mais longas, com muito texto, requerem mais tempo de escrita, de leitura e de reflexão na elaboração da resposta; promovem um discurso mais formal, elaborado, letrado. Mensagens curtas agilizam a interação por diminuir o tempo de resposta necessário para a elaboração da mensagem, requerem menos tempo para a digitação e muitas vezes são enviadas sem que o texto seja revisado – tanto que é comum, no mensageiro instantâneo e no bate-papo, uma pessoa enviar uma mensagem corrigindo o texto da mensagem anterior porque o erro só é percebido quando a pessoa relê a mensagem após já tê-la enviada, não sendo mais possível corrigir o texto original. Nesses meios, a premência da interação é mais importante do que os formalismos da língua escrita. São usados emoticons :-D, sobrecarga de pontuação !!!, alooooongamento vocálico, dentre outros recursos para dar mais emoção e incorporar características do discurso oral na mensagem digitada, fenômeno conhecido como reoralização da língua escrita (Hilgert, 2000).

A produção de mensagens curtas é imposta, em alguns sistemas, pela limitação na quantidade de caracteres por mensagem, como exemplificam o Twitter (mensagens restritas a 140 caracteres), SMS (160 caracteres) e o protocolo de bate-papo IRC (510 caracteres). Ainda que não seja por imposição, a interface e as funcionalidades do serviço de conversação induzem à produção de mensagens curtas ou elaboradas por fornecerem pistas sobre a quantidade esperada de texto. Por exemplo, na maioria dos serviços de email, é apresentada uma área de digitação com dezenas de linhas, levando o usuário a crer que ali é para digitar muito texto; também são apresentadas funcionalidades para formatar o texto e enviar arquivos anexados à mensagem, indicando que a mensagem pode ser mais elaborada do que um texto simples; e ao selecionar uma mensagem para a leitura, geralmente a mensagem é apresentada ocupando a tela inteira, uma por vez – tudo para indicar, induzir ou se adequar à realidade de que os textos produzidos naquele meio são elaborados. Já no microblog do Facebook (“Feed de Notícias”), é apresentada inicialmente apenas duas linhas de texto para a digitação de uma nova mensagem (“Status”); o texto precisa ser simples, pois não são disponibilizadas funcionalidades para a formatação do texto; e mesmo que a mensagem contenha um texto grande, para os leitores-seguidores são apresentadas inicialmente apenas as primeiras linhas da mensagem, sendo que as mensagens são apresentadas uma após a outra na mesma tela – tudo para induzir à produção de mensagens curtas.

Diferenciação dos meios em função dos critérios

Na tabela a seguir é apresentada uma seleção e síntese dos critérios discutidos na seção anterior. Essa tabela representa a taxonomia que propomos para a caracterização e diferenciação criteriosa dos meios de conversação.

Meios CRITÉRIOS
sincronia de conversação privacidade de conversação forma de linguagem organização das mensagens tamanho das mensagens
Email assíncrona particular texto lista elaborada
SMS assíncrona particular texto lista curta
Blog assíncrona em grupo texto centrada elaborada
Microblog assíncrona em grupo texto centrada curta
Fórum de Discussão assíncrona em grupo texto tópicos elaborada
Lista de Discussão assíncrona em grupo texto lista elaborada
Mensagem em grupo assíncrona em grupo texto lista curta
Mensageiro Instantâneo síncrona particular texto lista curta
Audiochamada síncrona particular áudio fluxo curta
Videochamada síncrona particular vídeo fluxo curta
Bate-papo síncrona em grupo texto lista curta
Audio-conferência síncrona em grupo áudio fluxo curta
Video-conferência síncrona em grupo vídeo fluxo curta

A taxonomia representada na tabela anterior, também pode ser representada graficamente em forma de uma árvore invertida, como na figura a seguir.

A partir dessa árvore foi feita a ilustração da abertura deste capítulo: uma árvore simplificada em que foram registrados apenas os valores que diferenciam os meios. Aquela ilustração é uma referência para a Árvore da Vida (da Biologia), contudo, enquanto a árvore da vida representa o ancestral comum entre duas espécies, a árvore simplificada representa as diferenças entre os meios de conversação (as relações evolutivas entre os meios de conversação são discutidas no próximo capítulo).

Seguindo o mesmo esquema empregado na árvore de diferenciação ilustrada na abertura do capítulo, o modelo que representamos em forma de mandala (na capa deste livro) é outra forma de representar a diferenciação dos meios. Esse esquema também fundamentou a construção do nosso dicionário com a definição dos meios de conversação.

Os critérios selecionados para a diferenciação dos meios constituem a taxonomia aqui proposta. Como pode ser constatado na tabela, não há duas linhas com os mesmos valores, pois se houvesse estaria faltando algum critério para diferenciar dois meios de conversação. Por outro lado, qualquer outro critério que adicionássemos nessa taxonomia seria redundante, pois todos os meios já estão discriminados. Daí se conclui que os critérios que selecionamos são suficientes para diferenciar cada um dos meios que enumeramos.

Também zelamos pela simplicidade da taxonomia. A distribuição dos meios ao longo de espaços contínuos, embora possibilite uma análise mais aprofundada, aumenta a complexidade da classificação. Por exemplo, é interessante compreender que os meios de conversação são adequados para diferentes tamanhos de grupo, mas para a nossa taxonomia é suficiente diferenciar os meios que possibilitam uma conversa particular (restrita a duas pessoas) dos que possibilitam a conversa em grupo (três ou mais pessoas). Se essa dicotomia é suficiente para a diferenciação dos meios, então não precisamos adotar uma categorização mais detalhada (dupla, grupo pequeno, turma, comunidade e multidão), muito menos um espaço contínuo.

Seria possível propor um outro conjunto de critérios para a diferenciação dos meios, desde que seja suficiente para discriminá-los corretamente. Por exemplo, poderíamos supor que o critério “relação entre interlocutores” deveria fazer parte da taxonomia, pois é um critério relevante por ser muito utilizado para diferenciar os meios de comunicação de massa (relação unidirecional de um para muitos) dos meios de conversação (relação bidirecional em diferentes modelos: um-um, todos-todos, todos-um). Esse critério poderia substituir a privacidade da conversação, uma vez que a relação um-um é sinônimo de conversa particular, enquanto a conversa em grupo é caracterizada pelas relações todos-todos e todos-um. Observe, contudo, que o critério privacidade da conversação possui apenas dois valores (particular e em grupo), enquanto relação entre interlocutores possui quatro valores possíveis (um-todos, um-um, todos-todos e todos-um), aumentando desnecessariamente o conjunto de categorias da taxonomia. Além disso, a relação todos-um implica na organização centrada das mensagens (um valor da classificação dos meios quanto à organização das mensagens), sendo assim redundante por ser sinônimo.

De fato, identificamos que os critérios sincronia da conversação (síncrona ou assíncrona), privacidade da conversação (particular ou em grupo), e forma de linguagem (texto, áudio ou vídeo) são os critérios mais relevantes para a discriminação dos meios. Já os critérios organização das mensagens e tamanho da mensagem são necessários para discriminar especificamente os meios de conversação assíncrona.

Vários critérios encontrados na literatura apresentam alguma correlação, por isso não são muito úteis para diferenciar os meios. Por exemplo, os meios de conversação síncrona geralmente são os que apresentam mensagens mais curtas, mais informais e com características de oralidade, mais naturais, capturam melhor as emoções, e se apresentam mais adequados para uma conversa particular ou em grupos pequenos. Já os meios de conversação assíncrona geralmente são os que apresentam mensagens mais elaboradas, mais formais e letradas, menos naturais, expressam melhor o racional, e possibilitam que mais pessoas participem da conversa. Desta forma, critérios como oralidade-letramento, riqueza e naturalidade são aqui vistos como uma correlação, consequência ou combinação de outros critérios como sincronia da conversação e forma de linguagem.

Por fim, alguns outros critérios encontrados na literatura para classificar os meios de comunicação, como o suporte de comunicação e o sistema de gravação, não se aplicam a essa taxonomia porque todos os meios de conversação aqui classificados têm como suporte a computação e possuem sistema de gravação digital.

Classificando serviços de conversação

Cada serviço de conversação implementado num sistema computacional apresenta suas peculiaridades em termos de funcionalidades e de interface, e nem sempre é fácil reconhecer qual meio de conversação está sendo viabilizado num dado serviço. Para identificar corretamente o meio de conversação implementado num serviço de um sistema, é preciso analisar as características da conversação que se realiza pelo serviço. Os critérios discutidos na seção anterior guiam as análises.

Por exemplo, suponha que, ao usar o Facebook pela primeira vez, você estivesse tentando identificar qual é o meio de conversação que o Feed de Notícias implementa. À primeira vista você poderia ficar em dúvida se aquele serviço implementa um blog, microblog, mensagens em grupo, lista de discussão, fórum ou o quê? Neste caso, é preciso analisar as características da conversação em função dos critérios levantados na seção anterior:

  • Sincronia da conversação. O Feed de Notícias do Facebook foi projetado para estabelecer uma conversação assíncrona: a mensagem enviada pelo usuário é armazenada e apresentada posteriormente para os amigos (no momento em que o amigo se conecta ao Facebook). Embora esse serviço até possibilite a conversação síncrona (quando o autor da postagem tem centenas de amigos-seguidores dos quais alguns deles estão online e comentam imediatamente a mensagem recém-enviada), de fato o serviço foi projetado para qualquer amigo poder comentar a postagem a qualquer momento, não precisando estar conectado no mesmo instante em que o autor publicou a postagem; sendo assim, reconhecemos que este serviço foi projetado para estabelecer a conversação assíncrona.
  • Privacidade da conversação. O Feed de Notícias do Facebook foi projetado para estabelecer uma conversação em grupo: a mensagem enviada pelo usuário fica visível para todos os amigos-seguidores daquele usuário. Este serviço possibilita ao usuário configurar a visibilidade da mensagem, indicando que grupo acessará a mensagem, podendo: torná-la pública, acessível a qualquer pessoa mesmo que não seja um amigo daquele usuário; torná-la visível somente a pessoas específicas ou a um grupo mais restrito de amigos (família, melhores amigos, amigos mais próximos etc.).
  • Forma de linguagem. O Feed de Notícias do Facebook foi projetado para a troca de mensagens de texto. De fato este serviço possibilita ao usuário anexar fotos e vídeos, e também incluir emoticons no meio do texto, mas esses arquivos multimídia são complementares e voltados para enriquecer a conversação que se realiza efetivamente pela troca de textos digitados; portanto, reconhecemos que o texto é a forma padrão de linguagem desse serviço.
  • Organização das mensagens. No Feed de Notícias do Facebook, as mensagens são organizadas de forma centrada no usuário. Cada usuário mantém sua própria linha do tempo onde publica suas mensagens (Status). Ao publicar uma mensagem, os amigos-seguidores podem comentar essa postagem, e todo comentário fica associado à postagem original do usuário, colocando a postagem como o centro daquela conversa.
  • Tamanho das mensagens. O Feed de Notícias do Facebook induz à produção de mensagem curta. Embora não seja imposta uma limitação da quantidade de caracteres por mensagem, a interface e as funcionalidades desse serviço induzem os usuários a escrever mensagens curtas: a área de digitação contém inicialmente apenas duas linhas de texto, o texto é simples (sem formatação) e, quando uma postagem contém muito texto, são apresentadas apenas as primeiras linhas – tudo para indicar que naquele serviço são esperadas mensagens curtas.

A partir dessas cinco análises, é possível identificar que o Feed de Notícias do Facebook implementa um microblog. Essa identificação é realizada por qualquer um dos instrumentos apresentados anteriormente:

→ Pela tabela, reconhecemos que o microblog é o meio de conversação que satisfaz todas as características identificadas:

 

Meios CRITÉRIOS
sincronia de conversação privacidade de conversação forma de linguagem organização das mensagens tamanho das mensagens
EMAIL ASSÍNCRONA PARTICULAR TEXTO LISTA ELABORADA
SMS ASSÍNCRONA PARTICULAR TEXTO LISTA CURTA
BLOG ASSÍNCRONA EM GRUPO TEXTO CENTRADA ELABORADA
MICROBLOG ASSÍNCRONA EM GRUPO TEXTO CENTRADA CURTA
FÓRUM DE DISCUSSÃO ASSÍNCRONA EM GRUPO TEXTO TÓPICOS ELABORADA
LISTA DE DISCUSSÃO ASSÍNCRONA EM GRUPO TEXTO LISTA ELABORADA
MENS. EM GRUPO ASSÍNCRONA EM GRUPO TEXTO LISTA CURTA
MENS. INSTANTÂNEO SÍNCRONA PARTICULAR TEXTO LISTA CURTA
AUDIOCHAMADA SÍNCRONA PARTICULAR ÁUDIO FLUXO CURTA
VIDEOCHAMADA SÍNCRONA PARTICULAR VÍDEO FLUXO CURTA
BATE-PAPO SÍNCRONA EM GRUPO TEXTO LISTA CURTA
AUDIOCONFERÊNCIA SÍNCRONA EM GRUPO ÁUDIO FLUXO CURTA
VIDEOCONFERÊNCIA SÍNCRONA EM GRUPO VÍDEO FLUXO CURTA

→ Percorrendo a árvore de cima para baixo, critério a critério, chegamos à identificação do meio microblog:

→ Percorrendo o modelo de dentro para fora, critério a critério, também chegamos à identificação do meio microblog:

→ Pelo dicionário, reconhecemos que a descrição do microblog é a que melhor caracteriza a conversação que se realiza pelo serviço Feed de Notícias do Facebook:

Microblog
Meio de conversação assíncrona em que o autor divulga mensagens de texto curtas para serem comentadas por todos.

A taxonomia apresentada neste capítulo é útil em diferentes cenários. Apoia a caracterização e a compreensão dos diferentes meios de conversação. Auxilia a projetar as funcionalidades do serviço de conversação para que seja implementado um determinado meio de conversação num novo sistema. Também é útil para sugerir meios de conversação ainda não estabelecidos culturalmente – por exemplo, pelo diagrama constata-se que a forma de linguagem em vídeo ainda não se estabeleceu como um importante meio de conversação assíncrona, embora o YouTube já possibilite o envio de um vídeo como resposta a outro. Vários ramos do diagrama ainda não se diferenciaram – cada diferenciação é uma oportunidade para explorar meios ainda não usuais de conversação.

Esclarecendo algumas confusões

Os meios de conversação que foram aqui identificados, caracterizados e diferenciados pela taxonomia elaborada, constituem o nosso ponto de partida para analisar a evolução desses meios. Há, contudo, algumas questões que precisamos discutir antes de encerrar o capítulo. Uma delas é que às vezes é confuso reconhecer e classificar os serviços de conversação de um sistema, com exemplificam alguns serviços do Facebook.

No Facebook, um mensageiro instantâneo é implementado na janela que se abre quando queremos conversar com um amigo online; essa mesma interface gráfica também é usada para deixar recados para o amigo caso ele não esteja online, caracterizando-se num serviço de SMS. Ainda nesta mesma janela, podem ser adicionados outros amigos na conversa, caracterizando-se num serviço de mensagens em grupo; e se todos os amigos adicionados à conversa estiverem online, comporta-se como um bate-papo. O registro da conversa que se realiza nessa janela é acessado pelo serviço Mensagens, que se caracteriza num serviço de email. Ao enviar para um amigo uma mensagem de email pelo serviço Mensagens, e se este amigo estiver online, a mensagem é apresentada na janela do serviço de mensageiro instantâneo, oferecendo para os interlocutores a interface para a conversa síncrona. Para o Facebook, o importante é o usuário estabelecer conversas com seus amigos de sua rede social, não importando muito por qual serviço. O usuário usa uma ou outra interface, e o Facebook executa o serviço que for adequado dependendo do contexto conversacional – a interface permanece a mesma, mas o serviço muda se o amigo estiver online ou offline, se a conversa for com um único amigo ou com vários. A dificuldade para reconhecer os serviços de conversação do Facebook se deve, em parte, pela necessidade de diferenciar o serviço da interface. Seria mais fácil reconhecer que são serviços diferentes se cada serviço apresentasse uma interface distinta, mas não é este o caso. O que queremos alertar, com essa discussão, é a dissociação entre o serviço de conversação e a interface gráfica: há casos em que um mesmo serviço é acessado por diferentes interfaces, e uma mesma interface dá acesso a diferentes serviços. Isso não invalida nossa concepção de que a unidade de análise e classificação é o serviço de conversação implementado num sistema, ainda que seja necessário reconhecer que numa mesma interface estejam implementados dois ou mais serviços de conversação.

Outra confusão recorrente está relacionada com a terminologia empregada para caracterizar alguns serviços de conversação. Como acabamos de discutir, numa mesma interface do Facebook são executados os serviços de mensageiro instantâneo, SMS, mensagens em grupo e bate-papo. Neste caso, é um preciosismo reconhecermos como serviços diferentes; seria apenas um único serviço de conversação? O sistema Gmail rotula de “Bate-papo” o que reconhecemos como sendo um serviço de mensageiro instantâneo, e outros sistemas também rotulam de bate-papo o que reconhecemos como mensagens em grupo – seriam casos de abuso terminológico?

Como apresentado e discutido neste capítulo, do nosso ponto de vista são meios diferentes: mensageiro instantâneo, SMS, mensagens em grupo e bate-papo. A confusão ocorre porque esses meios são parecidos e em nossa taxonomia se diferenciam por apenas uma característica, como esquematizado a seguir:

Por reconhecermos como meios distintos, consideramos sim como um abuso terminológico chamar de bate-papo o que se caracteriza, de fato, como um mensageiro instantâneo.

 

 

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